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Substância que guia a trilha de formiga é produzida por bactéria simbiótica

Pesquisa com formiga do gênero Atta revela que bactéria presente em sua microbiota atua não só na comunicação entre os indivíduos, mas também na defesa da colônia contra patógenos

Peer-Reviewed Publication

Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo

<i>Atta sexdens rubropilosa</i> Worker

image: This is an Atta sexdens rubropilosa worker view more 

Credit: Eduardo Afonso da Silva Junior

Pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP) em Ribeirão Preto, Brasil, descobriram que uma bactéria encontrada na microbiota associada à formiga Atta sexdens rubropilosa é capaz de produzir o chamado "feromônio de trilha", isto é, os compostos aromáticos usados pelo inseto para demarcar seu caminho até o ninho.

O achado foi divulgado em artigo publicado na revista Scientific Reports.

No caso da Atta sexdens rubropilosa, substâncias pertencentes à classe das pirazinas guiam as formigas em seu caminho até o formigueiro, sem qualquer desvio. Professora da Faculdade de Ciências Farmacêuticas de Ribeirão Preto (FCFRP-USP) e coordenadora da pesquisa, a pesquisadora Mônica Tallarico Pupo salientou que produção das pirazinas pela microbiota da formiga foi observada em mais de uma colônia.

"Será que o feromônio de trilha é produzido pela bactéria Serratia marcescens? Ou será que a bactéria apenas contribui com esse processo de alguma forma? É algo que pretendemos investigar", disse.

O trabalho foi conduzido durante o doutorado de Eduardo Afonso da Silva Junior, em parceria com pesquisadores da Harvard University, nos Estados Unidos, no âmbito de um Projeto Temático apoiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo - FAPESP e pelos National Institutes of Health (NIH).

Como Pupo explica, a bactéria produtora de pirazinas foi descoberta por acaso, quando os cientistas buscavam microrganismos capazes de proteger o formigueiro contra fungos parasitas.

"As folhas que as formigas cortadeiras carregam para o ninho servem, de fato, como substrato para cultivar fungos da espécie Leucoagaricus gongylophorous, que elas usam como alimento. Mas esse sistema é suscetível a infecções", disse.

"Em alguns casos, cresce sobre a fonte de alimento uma outra espécie patogênica, que pode comprometer a viabilidade do formigueiro. As bactérias simbiontes produzem compostos capazes de matar o fungo parasita sem prejudicar a fonte de alimento. Nós estávamos atrás desses compostos", acrescentou a coordenadora de bolsa FAPESP.

Os experimentos descritos no artigo foram feitos com colônias coletadas em Ribeirão Preto, dentro do campus da USP. Quando os cientistas conseguiam coletar a rainha, parte do formigueiro era transportada e mantida no laboratório. Em seguida, todas as bactérias encontradas na superfície e no interior dos corpos dos insetos foram isoladas, caracterizadas e colocadas em meio de cultura.

Durante esse processo, Silva Junior percebeu que quando a espécie Serratia marcescens era cultivada in vitro liberava um aroma forte muito semelhante ao dos formigueiros mantidos em laboratório.

"Decidimos investigar os compostos voláteis produzidos por essa bactéria e descobrimos as pirazinas - entre elas uma molécula nunca antes descrita na literatura científica", disse Pupo.

Os pesquisadores usaram uma espécie de fibra capaz de absorver os compostos aromáticos da placa de cultura. O material foi, posteriormente, analisado por cromatografia gasosa associada à espectrometria de massas.

"Nas glândulas de veneno das formigas encontramos tanto as pirazinas como a bactéria. Não sabemos ao certo se existe uma síntese compartilhada ou se o microrganismo produz os compostos aromáticos e o inseto apenas os estoca em suas glândulas. Pretendemos, em estudos futuros, testar técnicas para remover essa bactéria da formiga e, assim, observar se os compostos continuam sendo produzidos", explicou Pupo.

Outro plano do grupo é investigar se fenômeno semelhante pode ser observado em outras espécies de formiga - algo ainda não descrito na literatura científica.

Metamorfose de abelhas

O cultivo de fungos no interior do ninho - seja com fins de nutrição ou defesa - parece ser uma prática disseminada entre os insetos sociais. Em 2015, pesquisadores brasileiros descreveram na revista Current Biology que larvas de abelhas sem ferrão da espécie mandaguari (Scaptotrigona depilis) se alimentam, ao nascer, de filamentos de um fungo encontrado dentro das células de cria. Sem esse alimento, os insetos não conseguem chegar à fase adulta.

Esse processo de simbiose foi estudado mais profundamente pelo grupo de Pupo recentemente, durante o doutorado de Camila Paludo, no âmbito do mesmo Projeto Temático apoiado pela FAPESP. Os resultados foram divulgados na revista Scientific Reports em janeiro.

"Sabemos que os insetos não são capazes de sintetizar os próprios hormônios. Eles precisam adquirir substâncias precursoras por meio da dieta. Nossa hipótese era que o fungo forneceria um precursor para o hormônio de muda, necessário para a abelha completar a metamorfose", disse Pupo.

O primeiro passo da investigação foi isolar o fungo das células de cria e caracterizá-lo em laboratório. O grupo identificou tratar-se da espécie Zygosaccharomyces sp.

"Não sabemos ao certo como esse fungo vai parar no interior da célula de cria. As abelhas colocam os ovos e depois preenchem a cela com um líquido chamado alimento larval. Cerca de três dias depois, o fungo começa a crescer ali dentro", contou a pesquisadora.

Com uma técnica conhecida como microscopia de fluorescência, os pesquisadores encontraram acúmulo de lipídeos no citoplasma do fungo - tanto nas amostras cultivadas em laboratório como nas extraídas diretamente de colônias de abelha.

"Os esteroides - substâncias precursoras dos hormônios de muda - têm natureza lipídica. Com auxílio da cromatografia gasosa acoplada à espectrometria de massas identificamos que o composto predominante entre os lipídeos desse fungo era o ergosterol", disse Pupo.

Por meio de experimentos in vitro, os pesquisadores comprovaram que as larvas conseguiam completar a metamorfose quando o fungo era inoculado no alimento das larvas e também quando era acrescentado apenas o ergosterol.

"Os resultados foram estatisticamente equivalentes para essas duas situações", relatou Pupo. "Porém, quando as larvas recebiam somente o alimento larval não conseguiam chegar à fase adulta. Concluímos, portanto, que o ergosterol está de fato sendo usado pelas larvas na produção do hormônio de muda, o que reforça a relação de dependência entre a abelha e o fungo", acrescentou.

Agora, o grupo pretende investigar se fenômenos semelhantes ocorrem em outras espécies de abelha com e sem ferrão.

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